quinta-feira, janeiro 31, 2008

A nata de Piracanjuba

O contato com a cultura também é qualidade de vida. Mais um ponto a favor para as pequenas cidades do interior. Quando, em São Paulo, eu teria a oportunidade de ir a uma reunião da Academia Paulista de Letras, se eu não tenho nenhuma produção literária? Em Piracanjuba (GO) eu tive essa chance, pois meu tio Idelson é membro da Academia Piracanjubense de Letras. No dia que eu cheguei na cidade, fui convidada para a reunião na mesma noite.

O motivo era a análise da obra Devaneios de Insônia, de Laeste Antonio de Souza. Poesias inspiradas durante as noites de insônia do autor, levou um ano para terminar. São diversos temas, que vão de dúvidas existenciais ao amor platônico. Mas ele é um romântico contumaz, que poderia ter escrito sua obra de qualquer lugar do mundo, do Taiti à Patagônia, já que seus temas são universais. Mas ele se rende à alma piracanjubense com as referências ao relógio da cidade, nas páginas dedicadas ao Big Neno.

Foi um privilégio participar deste bate-papo. O grupo, formado por professores, estudantes, profissionais liberais e intelectuais da cidade, fez uma análise bastante construtiva para o autor, observando as tendências da obra e sua posterior utilização como ferramenta de ensino, já que a cidade precisa consolidar suas manifestações culturais junto aos jovens, que também estavam lá participando do encontro.

Espero que este grupo se torne cada vez mais forte e sirva de exemplo para outras regiões, pois iniciativas como esta são vitais para a preservação da cultura brasileira, que, se por um lado é das mais ricas do mundo, pode empobrecer se não for cultivada.

Cuidando da vida dos outros



Não há dúvida que nas cidades do interior é mais fácil ter qualidade de vida. As distâncias são mais curtas, o trânsito é tranqüilo, todos se conhecem, as portas das casas ficam abertas. Mas como todo o bônus tem o seu ônus, a intimidade demais também atrapalha. Ninguém pensa duas vezes antes de cuidar da vida do outro. Mesmo que este outro não pertença a cidade. Está ali, é do mesmo território.

Em Piracanjuba, interior de Goiás, é assim também. Lá tem um calçadão de 2.370 m, para ser bem exata, onde a população faz as saudáveis caminhadas pela manhã. Num sábado nublado, duas pessoas que visitavam a cidade resolveu conhecer o local. Andando lado a lado, eles conversavam, e depois de uns minutos a mulher deixou o homem sozinho e saiu correndo. O morador que passeava ali de bicicleta não teve dúvida: foi falar com o homem para saber por quê eles brigaram.

“Ô sô, ocê vai deixá a muié fugir assim? Não vai atrás dela não? Vai ficar parado aí? Vai lá!”
O homem respondeu: “Eu não corro atrás de mulher. Elas que corram atrás de mim!”
Só que o homem não explicou para o morador que ele era meu pai e que eu estava correndo para treinar. Deixou ele pensar o que ele quis.

segunda-feira, janeiro 14, 2008

Na mesma semana, céu e inferno




Cena irritante: Criaram o Poupa Tempo há dez anos, que descobri nesta semana que deveria se chamar Gasta Tempo. Para renovar a carta de motorista, levei um minuto para achar o site do Detran, uns cinco para achar a relação de locais credenciados para exame médico, uns 15 minutos para fazer o exame (contando com a espera, tinha duas pessoas na minha frente), e mais 15 para a provinha de direção defensiva e primeiros socorros. Mas lá se foram mais de quatro horas só para entregar os documentos no Perde Tempo. Uma hora para pegar a senha, três horas para ser chamada, 40 minutos para pagar a taxa do banco e mais 10 minutos para concluir o processo. Um sufoco, esse Joga Fora Tempo.

Cena de alívio: Na mesma semana, resolvi que viajar para Goiás, onde a febre amarela está preocupante. Descubro que a minha vacina venceu no ano passado e estou a 12 dias da viagem. Leio os jornais e vejo que o pânico tomou conta da população: 6 horas de fila no aeroporto de Congonhas e 4 horas em Guarulhos. Um telefonema salvador do meu pai resolve: o Instituto Pasteur, a 500 metros de casa, estava de plantão no domingo para aplicar a vacina. Fui preparada com livros e jornais para agüentar horas de fila, disposta a conseguir uma dose. Surpresa: ninguém do lado de fora do prédio. Entrei, ninguém na minha frente. Só me perguntaram se eu ia viajar e para onde. Pronto, em cinco minutos já estava imunizada. E nem doeu.

quinta-feira, janeiro 03, 2008

Perdi o medo de brigadeiro


Sempre tive uma boa relação com a brigadeiro. Tanto que moro a duas quadras dela, passo por ela diariamente, a pé ou de carro. Mas nunca pensei em subi-la correndo, inteirinha, sem parar, como fazem os atletas que participam da São Silvestre. Nem pensar.

Acompanho a São Silvestre desde criança, um charme essa competição que atrai gente do mundo inteiro para fechar o ano em grande estilo. Um dia vou participar, mas preciso treinar antes. Perdi a inscrição de 2006, que raiva! Ano que vem não escapa. Fiquei atenta e fui uma das primeiras a garantir um lugar na prova de 2007.

A cidade toda estava ali, na Paulista, para correr ou para assistir a São Silvestre. Parecia uma festa: pessoas conversando, bebendo, rindo, encontrando amigos, fantasiadas para se diferenciar. Entrei no clima e corri com a Midori, para continuar tendo companhia na festa.

Na largada, deu tempo de conter o nervosismo, já que nem dava para correr. Foi meu aquecimento, e no caminho os vestígios de que ali realmente tinha acontecido uma festa: copos, garrafas, pedaços de roupas, restos de comida, um pé de chinelo e muito lixo. Tudo bem, no dia seguinte o pessoal da limpeza urbana dá um jeito.

Fui marcando o tempo, o primeiro quilômetro não vinha, nem o segundo, nem o terceiro.... só no sexto vi a marcação. Já fiquei perdida no meu ritmo. Segundo problema: sede. Naquele calor senegalês, a água só foi oferecida no quarto quilômetro. E quente! Fazer o quê, melhor que desmaiar. Quem está na corrida é para correr e não para passar mal.

Na metade do percurso, lá na avenida Pacaembu, me deu um certo cansaço. Pensei em desistir, o calor e toda aquela gente amontoada correndo estava me fazendo mal. Sorte que logo veio um posto de hidratação e entrei em cena com o meu power gel. Deu uma animada, a Midori não deu sinais de cansaço e me reanimei.

Antes mesmo de chegar à famigerada brigadeiro, no Largo São Francisco, os corredores começaram a gritar. Brigadeiro!!! Brigadeiro!!!! Acho que eles estavam chamando por ela ou queriam comer brigadeiro para agüentar a subida de 2 quilômetros. Me enchi de coragem, engatei a segunda e fui sem pensar. No mesmo ritmo. Quando eu percebi, já estava a duas quadras da Paulista. Consegui um pequeno sprint para alcançar a chegada com a marca de 1hora e 27 minutos. A festa não tinha acabado, mas a brigadeiro sim. Perdi o medo dela.